Estudar golfinhos nunca foi uma tarefa muito fácil, afinal estes carismáticos animais passam a maior parte de suas vidas em baixo d’água. Por muitas décadas, os estudos extraíram o máximo de informação possível do pouco que se pode registrar quando estes animais vêm à superfície para respirar. É incrível quantas descobertas se pode fazer nesse tempo tão curto da vida dos golfinhos, o tempo de alguns borrifos. Felizmente, com o avanço da tecnologia surgem oportunidades de se observar e acompanhar mais a fundo (e no fundo dos mares, lagoas e estuários) a vida fascinante dos golfinhos. Dentre as novas ferramentas, os cientistas passaram a contar nas últimas décadas com o monitoramento acústico. Golfinhos e baleias são animais que usam o som para muitas das atividades de suas vidas. Os sons que os golfinhos produzem não são usados só para conversar. É pelo som que os golfinhos “enxergam mais longe” e procuram por comida. Também são capazes de se reconhecer usando sons que representam seus nomes. Isso mesmo, os golfinhos se reconhecem por sons específicos como nós nos reconhecemos pelo nome. Assim, com a possibilidade de gravar os sons embaixo d’água, os cientistas abriram uma enorme janela para estudar a vida destes animais. É esta janela que estamos começando a abrir em Laguna, para entender a ecologia dos golfinhos e o comportamento único da pesca cooperativa.
A primeira iniciativa de implantar um monitoramento acústico dos golfinhos em Laguna (onde são conhecidos como botos) começou em 2018, com uma proposta de doutorado. Em 2020 e 2021 foi realizado efetivamente o monitoramento acústico da população de botos de Laguna: cinco a seis gravadores foram colocados na Lagoa Santo Antônio para gravar os botos por 2-3 dias consecutivos. Estes registros aconteceram duas vezes em cada estação do ano em 2020, e mais algumas vezes em 2021. O objetivo deste monitoramento é entender como os botos usam a lagoa, principalmente à noite, quando não é possível fazer registros visuais. Lembra do som que o boto usa para “enxergar”? Esse som é a ecolocalização. Ele é um bom indicativo da presença do boto e permite saber, através do monitoramento acústico, onde o boto está. Algumas vezes dá até pra saber se o boto está comendo! Não, ele não mastiga de boca aberta, mas tem um som que ele faz quando pega o peixe. E a história dos “nomes” dos botos? Pois é, com o monitoramento acústico dá pra saber até quem estava na área! Resultados preliminares mostram que é possível saber até para onde o boto foi, usando o registro destes sons, os assobios, que identificam cada golfinho individualmente.
O monitoramento acústico é um método complementar aos estudos desenvolvidos pelo PELD porque permite monitorar os botos dia e noite, independente das condições climáticas, por várias horas seguidas. Assim, o monitoramento dos botos pode acontecer inclusive à noite, registrando a presença dos botos no sistema lagunar e o uso que eles fazem da área ao longo das 24 horas do dia. Inclusive, saber se os botos permanecem nas mesmas áreas mesmo à noite, quando os pescadores não estão presentes, pode ajudar a entender a interação entre botos e pescadores. Também é possível explorar o uso da lagoa por embarcações, visto que o som dos motores dos barcos é registrado nas gravações. Assim, apesar de ser uma iniciativa recente, o monitoramento acústico é uma ferramenta com potencial de responder muitas perguntas e ajudar a monitorar os botos de Laguna. Quem sabe num futuro, não muito distante, possamos identificar cada boto da população não só pela fotografia da nadadeira dorsal, mas também pelos assobios que emitem. Estamos no caminho!